Revolução Russa: o Poder dos Sovietes contra o estatismo

 

VI. Considerações sobre Partido Revolucionário na luta dos trabalhadores

 

O documento intitulado de Plataforma Organizacional (1926) publicado no Dielo Trouda assume relevante papel histórico na medida em que é o resultado de uma discussão e avaliação, tomados a partir de uma experiência concreta. A sua concepção e fundamentação recorre à Revolução Russa, sem fazer vista grossa à própria participação dos anarquistas. Um documento que seus próprios autores alertam que está sujeito a equívocos e imprecisões, e de fato os têm. Mas ainda que os carregue, leva o mérito de ser uma resposta concreta aos caminhos que o anarquismo vinha trilhando, distanciando-se da classe trabalhadora ou fazendo de sua prática política apenas um fenômeno na luta de classes, quando não uma caricatura. Nestor Makhno e Piotr Archinov são os principais autores e animadores da idéia que coloca no centro do debate a organização dos anarquistas em Partido.

Entendemos que o anarquismo, após Bakunin, perdeu bastante tanto do ponto de vista teórico quanto político-organizacional e suas razões históricas estão intimamente relacionadas ao fim da AIT, da luta contra a social-democracia alemã ou mesmo das idéias desenvolvidas por Kropotkin que ganhavam ressonância no meio. Mas não nos ocuparemos de discutí-las. O importante é assinalar que as atividades de Bakunin na construção de uma Organização revolucionária para atuar no movimento internacional dos trabalhadores ocupou o centro de suas atividades políticas. Entendemos que foi Bakunin o primeiro revolucionário pós-48 a elaborar de maneira clara e minimamente fundamentada a necessidade e o papel da Organização (ou Partido) no processo revolucionário. Por isso, a Plataforma não “inventa” nada novo, nem queria “bolchevizar” o anarquismo como foi acusada em críticas, as quais, muitas com hesitações francamente liberais.

A necessidade de uma organização especificamente anarquista foi sentida no próprio desencadear do processo revolucionário russo. Quando dos acontecimentos do levante de outubro, Makhno em suas memórias da revolução aponta para o “papel particularmente destacado [dos anarquistas], na vanguarda dos marinheiros, dos soldados e dos operários” presentes em Petrogrado, Moscou e outras cidades industriais (MAKHNO, 1988, p. 156). Sendo que

[...] não puderam ter sobre o país uma influência revolucionária comparável à desses dois partidos [bolcheviques e SR-esquerda] que tinham formado um bloco político sob a direção deste mesmo astucioso Lênin e sabiam exatamente aquilo que deviam empreender antes de mais nada neste momento e de que força e energia podiam dispor (Id., 1988, p. 156)

Ocorre que de tal maneira “o movimento anarquista, tão vivo e tão cheio de entusiasmo revolucionário, encontrou-se a reboque dos acontecimentos” (Id.,1988, p. 157). O motivo? Especialmente dois: dispersão e confusão ideológica. Sem meias palavras, a Plataforma anuncia que para o anarquismo sair do “pântano da desorganização”, se faz preciso um método para a construção da organização de sua ação. Refuta o preconizado pelo anarco-sindicalismo, pois este liquidava a questão da organização dos anarquistas em corpo específico, limitando-se “somente pela penetração e aumento de forças do proletariado” (Id., 2001, p. 37). O anteriormente mencionado sintetismo também é rejeitado, pois para a Plataforma o método correto é “reorganizar militantes anarquistas ativos baseando-se em posições precisas: teórica, tática e organizacional a base mais ou menos perfeita de um programa homogêneo” (Id., 2001, p. 37).

A “noção de Síntese” teve suas posições estruturadas no próprio debate desencadeado com a Plataforma, com respostas e contra-respostas. Seus responsáveis são o francês Sebastian Faure e Volin, este último que tinha através da Nabat prestado apoio direto ao movimento makhnovista. Considerava que o anarquismo partilhava três tendências (comunista, sindicalista e individualista), mas que tais poderiam buscar seus pontos de interseção e caminharem juntas em uma mesma organização. A formulação era vista como completamente inepta, pois para os plataformistas o comunismo era o objetivo e o sindicalismo um método de luta dos trabalhadores. Não só, o individualismo como expressão do anarquismo é completamente refutado, uma vez que não é nada mais do que “negação da luta de classes” e, sendo assim, “toda essa filosofia não tem nada a ver com a teoria ou a prática anarquista” [11].

Até mesmo Errico Malatesta que compreendia a necessidade dos anarquistas não somente se organizarem enquanto movimento social, enquanto trabalhadores, mas também se agrupassem politicamente de maneira a formular e levar pela atuação militante seu programa aos movimentos, sindicatos e entidades em que se fizesse presente, mesmo Malatesta com esta compreensão, vai se colocar contra a Plataforma com argumentos pouco convincentes e pagando tributo aos defensores de uma abstrata e inexplicável “liberdade individual” como contraposição da ação unitária e coordenada.

Portanto, o essencial exposto na Plataforma fica intacto e instiga para que os anarquistas não sejam meros “representantes platônicos” de belos ideais e que estes venham a assumir relevante papel na linha de frente do movimento de massa. Dizia Makhno (2001, p. 78) com firmeza: “Então, minha experiência das batalhas revolucionárias do passado me leva a acreditar que, não importa qual seja a sucessão dos eventos revolucionários, alguém precisa assumir a direção ideológica e dar as ordens táticas”. Tal era o espírito da plataforma, fazer do anarquismo na luta de classes não uma questão episódica, mas um fator relevante, fazer dos anarquistas não meros auxiliares (muitas vezes irresponsáveis), mas a “expressão de um entendimento consciente e responsável do trabalho militante” (Id., 2001, p. 85), como afirmou Archinov.

Entretanto, quando se fala em “guia teórico e ideológico” não significa dirigismo. A Organização Política não deve se constituir como um poder sobre as massas. Deve se posicionar de modo a buscar ser uma expressão consciente do proletariado e isso não é feito na base da auto-proclamação, tão comum entre os bolcheviques. O protagonismo de classe é a pedra angular de toda a movimentação do trabalho militante anarquista e, portanto, o Partido anarquista não se pretende a representar, muito menos a substituir os trabalhadores. Sua razão de existência não é outra senão participar integralmente dos dilemas cotidianos da luta, se estabelecendo em condição de igual, falando de trabalhador para trabalhador.

Se para os bolcheviques os Sovietes eram vistos como elemento auxiliar do projeto de seu partido, aqui a equação é justamente inversa. Os Sovietes ou qualquer outro espaço construído pela classe trabalhadora enquanto espaço de Poder Popular que abriga seus elementos através de uma representação social-econômica, são os organismos por excelência da organização e ação da classe trabalhadora. Já com Bakunin se pautava a existência de dois níveis distintos, mas não antagônicos, para a organização da luta revolucionária: o social-econômico e o político. O primeiro sendo o espaço de sindicatos, conselhos operários e camponeses, enfim, os espaços de organização de base, e o segundo relegado a organização própria dos anarquistas.

Quando definimos esta diferenciação e apresentamos como espaços de dinâmicas distintas, não o fazemos para hierarquizá-los na luta revolucionária, onde o primeiro espaço faz a luta “sindical” e o segundo elabora o programa e faz a luta revolucionária. As organizações de classe se organizam primeiro em critérios sociais e econômicos do que propriamente políticos, por isso são mais amplas, tem filiação aberta e seu programa tende a ser mais restrito. Com a Organização política o seu critério para agrupação não é simplesmente social-econômico (o que não quer dizer que seja irrelevante, pois para estar entre operários e camponeses, por exemplo, é preciso que a organização abrigue dentro de si militantes nesta condição). O que vai definir e diferenciar a Organização política é seu programa político e sua teoria, pois é em cima delas que se define o recrutamento de militantes. Portanto, entendemos, assim como Bakunin e a Plataforma, que trata-se de uma Organização de “minoria ativa” ou de quadros.

A centralidade da formação de uma Organização revolucionária, distinta dos movimentos de base, se faz na medida em que estes movimentos tendem muitas vezes a se deter seja em questões pontuais ou corporativas, numa conjuntura mais amena, seja a de se ocupar com discussões mais localizadas do problema geral de uma luta socialista revolucionária. Assim, a Organização Política, que não tem nenhum privilégio, deve assumir grandes responsabilidades e fornecer recursos teóricos, técnicos e políticos para o desenvolvimento e fortalecimento dos movimentos de base no seu avanço e na sua defesa. Dizia Bakunin a respeito da relação entre a AIT (organização de massa dos trabalhadores) com a Aliança secreta (organização revolucionária).

A Aliança é o complemento necessário da Internacional... Mas a Internacional e a Aliança tendendo para o mesmo objetivo final, perseguem ao mesmo tempo objetivos diferentes. Uma tem por missão reunir as massas de operários, os milhões de trabalhadores, através das diferenças de nações e dos países, através das fronteiras de todos os Estados, em um só corpo imenso e compacto; a outra, a Aliança, tem por missão dar às massas uma direção realmente revolucionária. Os programas de uma e de outra, sem serem opostos em nada, são diferentes pelo próprio grau de desenvolvimento respectivo. O da Internacional, se o tomarmos a sério, também é em germe, mas só em germe, todo o programa da Aliança. O programa da Aliança é a explicação última do da Internacional. (BAKUNIN, 2002, p. 74)

Podemos aqui fazer um discussão interessante quanto a dicotomia estabelecida entre a ação espontânea das massas trabalhadoras e a disciplina revolucionária. Em vários escritos de Bakunin podemos nos deparar com saudações à ação espontânea popular, mas isso não é o todo. Ao mesmo tempo, quando tratava de falar de Organização revolucionária, entendia como elemento central a disciplina – com o sacrifício de interesses e apreciações pessoais para integrar-se a luta – o que demonstra uma prática política atenta a empreender uma rigorosidade em suas intervenções, ou como dizia a Plataforma, uma posição responsável. Em outros termos, uma coisa é a ação espontânea das massas trabalhadoras, capaz de criar instrumentos poderosos de organização e luta como foram os Sovietes na Revolução Russa, outra coisa é pretender que uma prática política revolucionária contínua seja realizável sem que não exista planejamento e disciplina, pois a revolução social não é algo que cai da árvore de maduro. Portanto, não existe espontaneísmo, e sim uma análise que conclui a importância de um trabalho político e organizacional contínuo e constante. Nos diz Makhno que “a vida não é só uma arena para a propaganda desta ou daquela concepção, mas também, e da mesma forma, uma arena de luta, de estratégia, e de aspirações destas concepções na gestão da vida social e econômica.” (2001, p. 45).

O processo histórico da Revolução Russa deixou um vasto material para que possamos nos debruçar. Um rico momento de combinação de inúmeros fatores e métodos de luta que foram sendo experimentados, construídos e rejeitados. Tempos de luta clandestina e de luta aberta, relações entre campo e cidade, contexto de guerra mundial, país de economia periférica no capitalismo mundial, regime absolutista com luta socialista, etc.

Tais questões, naturalmente, exigiam da militância esforço duplicado para não ficar aquém dos acontecimentos. Já dissemos que os bolcheviques souberam tomar a direção do processo revolucionário com base em uma organização bastante eficiente que não tinha adversária a altura para competir politicamente os rumos da revolução. Mas seríamos levianos se também não identificássemos que souberam ser bastante atentos no quesito. Ou seja, de buscar captar o “movimento real” do processo desenvolvido na Rússia. As discussões iniciais sobre o caráter que a revolução russa deveria tomar (ditadura democrática do proletariado ou a própria ditadura do proletariado) atestam isso, mesmo que partam de premissas equivocadas. Dizia Lênin no Que Fazer? que “sem teoria revolucionária não existe movimento revolucionário”. Mas há aqui o grave problema de método.

Quando se anunciava a importância da teoria na orientação e no próprio desenvolvimento das forças revolucionárias, estas se fazia de cima à baixo. No Que Fazer? (1902) ao debater com perspectivas reformistas da social-democracia russa (prenúncio do racha em bolcheviques e mencheviques no ano seguinte), Lênin critica aqueles que renunciavam a uma luta revolucionária a pretexto de que era preciso maior participação na “luta econômica”.

No entanto, ao se opor aqueles que faziam defesa de um espotaneísmo pueril como forma de dissimular sua prática reformista, Lênin cai em um voluntarismo que pavimenta uma concepção “aristocrática” do processo revolucionário. Citando Kaustky, o líder bolchevique entendia que “a consciência socialista é algo introduzido de fora e não algo que surja espontaneamente” (LÊNIN, 1978, p. 48). Ainda se usando de Kaustky, Lênin parte do entendimento de que “o socialismo e a luta de classes surgem um ao lado do outro e não derivam um do outro; surgem de premissas diferentes” (Id., 1978, p.48). Ao colocar que o socialismo nasceu “fora” da classe trabalhadora, o papel da Organização ou Partido revolucionário só pode ser o de “injetar” o socialismo nas massas.

Ao averso, dizia a Plataforma

[...] o anarquismo não se origina de reflexões abstratas nem de um intelectual ou filosófo, mas sim da luta direta dos trabalhadores contra o capitalismo, das suas carências [...]

O nascimento, o florescimento e a realização das idéias anarquistas têm suas raízes na vida e na luta das massas trabalhadoras e estão inseparavelmente ligadas ao seu destino. (MAKHNO, 2001, p. 40-41)

O materialismo nos ensina que a vida que faz a idéia. Assim, se “a vida domina o pensamento e determina a vontade” para que se estabeleça uma “comunidade de pensamento” ela tem que ser forjada na mesma “comunidade de interesses” (BAKUNIN, 1977, p. 103). Assim, da ação espontânea da classe trabalhadora, provocada, sobretudo, pela sua própria condição objetiva de classe explorada e oprimida, o Partido revolucionário trabalha nem externamente, nem sobre a classe, mas junto a ela em um permanente trabalho de inserção para criar identidade enquanto classe, pois antes de ser “dirigente revolucionário” deve-se ser também militante de base. Isso faz toda a diferença. Pois

[...] o que denominamos ideal do povo não tem nenhuma analogia com as soluções, fórmulas e teorias político-sociais laboradas fora da vida deste, por doutos ou semidoutos, que têm a liberdade para fazê-lo, oferecidas de forma generosa a multidão ignorante como a condição expressa de sua futura organização. Não temos a mínima fé nessas teorias e as melhores dentre elas dão-nos a impressão de leitos de Procusto, muito exíguos para conter o amplo e poderoso curso da vida popular. (BAKUNIN, 2003, p. 237)

O elemento ideológico a ser expresso na organização e no grau de participação dos trabalhadores na luta, tal como o direcionamento dado a ela, representa aquilo que historicamente se constrói em seu seio aliado às condições materiais postas. Disso concluímos que não basta um Partido forte, é preciso uma classe trabalhadora forte e experimentada e isso é a melhor prevenção contra o encastelamento de burocracias.

A lógica do Partido Revolucionário Bolchevique é o espelho da ditadura do proletariado preconizada e a melhor expressão disso é a III Internacional formada em 1919 e anunciada como o “partido comunista único mundial” (CLAUDIN, 1985, p. 27). Se na estratégia do partido bolchevique o objetivo é a tomada do Estado, tendo na Revolução Russa os Sovietes efetivados objetivamente como meios auxiliares para tal, a III Internacional vai transformar-se em meio auxiliar da própria política do dito Estado operário. Certamente isso se intensificou com o triunfo de Stálin, mas teve seu direcionamento e bases assentadas desde o seu berço, pois na época de formação da III Internacional (Komintern) quando a Revolução Russa ainda era encarada como “prólogo da revolução mundial”, se gestava a teoria de que a guerra do capitalismo imperialista (enquanto resultado de seu estágio máximo de desenvolvimento) criava as condições em que bastava formar as “direções revolucionárias” para a classe trabalhadora acompanhar. Dizia que “a um apogeu capitalista, sem precedentes na história, deve suceder um apogeu da luta revolucionária” (Id., 1985, p. 66). Assim, a profundidade do reformismo no movimento operário europeu não parecia ser levada em consideração, tal como a própria capacidade do Capital se recompor. Fernando Claudin enfatiza que se na Rússia a revolução significou para os trabalhadores a paz, naquela altura, de um mundo recém saído de sua I Guerra Mundial, a revolução significaria a volta da guerra (Id., 1985, p. 62).

Essas posições defendidas fazem parte de uma concepção de hierarquização da ação do partido em relação a da classe trabalhadora, sendo o núcleo duro que orienta a prática política do partido bolchevique e seus precursores. Tanto que Trotsky vai fazer suas críticas à burocracia stalinista, mas a propósito do Programa de Transição (1938) afirmava que

As premissas objetivas da revolução proletária não estão somente maduras: elas começam a apodrecer. Sem vitória da revolução socialista no próximo período histórico, toda a civilização humana está ameaçada de ser conduzida a uma catástrofe. Tudo depende do proletariado, ou seja, antes de mais nada, de sua vanguarda revolucionária. A crise histórica da humanidade reduz-se à crise da direção revolucionária. [12]

O papel da vanguarda (Partido) é o de derrotar as direções traidoras, eis o reducionismo na luta dos trabalhadores. Por conta disso o Programa de Transição entende que “a tarefa central da IV Internacional consiste em libertar o proletariado da velha direção, cujo conservantismo se encontra em contradição completa com a situação catastrófica do capitalismo em seu declínio e constitui o principal obstáculo ao progresso histórico” [13].

Na medida em que hierarquiza e põe o Partido acima da classe (movimento), que supervaloriza o aparato dirigente quase que em oposição à capacidade política das classes trabalhadoras, o passo para a concepção de partido único na revolução é conseqüência, ainda que possa querer relativizar a questão. Como resultante disso, a apregoada ditadura do proletariado, só poderá ser, não somente um Estado suposto representante dos trabalhadores, mas um Estado da burocracia do partido que o dirige.

A Organização política de intenção revolucionária deve se ocupar de pensar a questão do poder e da estratégia de ruptura revolucionária, mas não retira como centro do processo revolucionário o protagonismo da classe trabalhadora, muitas vezes tratado apenas como um mero elemento ideológico de agitação política. Portanto, a Organização (ou Partido) que busca cumprir uma tarefa revolucionária não pensa a ruptura sozinha, não a constrói a parte e ainda que assuma tarefas especiais no decorrer do processo – como ações clandestinas, mas em ligação orgânica com a luta pública – não pode pensar em monopolizar as ações da classe trabalhadora. A Organização Política não é um fim em si, mas um meio de promover e intensificar a luta dos trabalhadores.

Quando refutamos a hierarquização da ação do partido à ação da classe trabalhadora, não é por tomar a relação inversa como a verdadeira. O movimento dos trabalhadores não pode estar subordinado à ação de nenhum Partido, ainda que se declare como o “partido revolucionário dos trabalhadores”, mas, da mesma forma, uma Organização que se pretende revolucionária também não se subordina ao grau ideológico e político do movimento de massa. A Organização ou o Partido revolucionário disputa seu programa no interior do movimento de massas. Sua ação então está em contato e diálogo, inclusive, com outras organizações e partidos, sejam de viés reformista seja de viés revolucionário, assim como em luta com a própria ideologia burguesa.

A estratégia de ruptura socialista, que pode ser via estatismo ou via Poder Popular, condiciona todo o trabalho militante. Portanto, a via do Estado, assumida na perspectiva bolchevique, é que os condiciona a hierarquizar e substituir a classe pelo Partido. A estratégia de ruptura que visa o desenvolvimento e fortalecimento do Poder Popular, ao não substituir a classe, trabalha para seguir com esta na tomada de seu papel concreto de sujeito revolucionário, desenvolvendo a consciência e intransigência da classe trabalhadora. É a cisão da concepção entre a minoria que sabe e a maioria que executa, para criar o Poder Popular onde o pensar e o executar se fundem. Dizia a Plataforma que

O anarquismo não aspira ao poder político [Estado] nem à ditadura. Sua principal aspiração é ajudar as massas a tomar o caminho autêntico da revolução social e da construção do socialismo. Mas não é o bastante que as massas tomem o caminho da revolução social. É também necessário manter esta orientação de revolução e seus propósitos: a superação da sociedade capitalista em nome dos trabalhadores livres. Como a experiência da Revolução Russa de 1917 nos mostrou, esta última tarefa está longe de ser fácil, principalmente por causa dos inúmeros partidos que tentam orientar o movimento para uma direção oposta à da revolução social. [...]

As massas exigem uma resposta clara e precisa dos anarquistas a respeito destas e de muitas outras questões. E, a partir do momento em que os anarquistas declaram uma concepção de revolução e da estrutura da sociedade, eles são obrigados a dar uma resposta clara à todas estas questões, relacionar a solução destes problemas à concepção geral de comunismo libertário, e devotar todas suas forças à realização destes. (MAKHNO, 2001, p. 46)

A “Plataforma Organizacional dos Anarquistas Russos no Estrangeiro” re-localiza o anarquismo, possibilita a ele superar hesitações e ir na direção de lhe dar organicidade e força para fazer triunfar a luta contra o Estado e o Capital. Fruto de uma derrota histórica da classe trabalhadora, esmagado por concepções estatistas, marca mais uma referência histórica de organização e luta.

 

Notas

[11] TROUDA, Dielo. El problema de la organización e la noción de síntese. Disponível em . Visto em outubro de 2007.

[12] TROTSKY, Leon. Programa de Transição. Disponível em http://www.marxists.org/portugues/trotsky/1938/09/prog_transicao/index.htm. Visto em outubro de 2007

[13] Idem.

 


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Source: Coletivo Anarquista Zumbi dos Palmares

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